O campo das artes enfrenta desafios significativos em uma era moldada por algoritmos e pela economia da atenção.
Quem nunca ouviu a frase “pendura uma melancia no pescoço” quando supostamente queria aparecer? Consigo ouvir a voz da minha mãe aqui! Essa era uma sugestão simples em um tempo onde as distrações eram menores e ter atenção era menos complicado do que nos dias atuais. Na era digital, onde a tecnologia e a conectividade moldam nosso dia a dia, a arte tem enfrentado uma série de desafios para ser vista.
Entre eles, podemos destacar a batalha pela atenção do público em um cenário dominado por algoritmos que personalizam as experiências online. Neste texto, exploraremos alguns desafios enfrentados no campo das artes visuais para criar e cativar um público em uma era onde nossos gostos e preferências são cada vez mais pautados por essas poderosas ferramentas digitais.
Quem não é visto não é lembrado: personalização e filtros de bolha
Um dos principais pontos, e aqui todos nós somos afetados em alguma medida, é o fenômeno dos filtros de bolha. O termo foi cunhado por Eli Pariser, e mostra que os algoritmos das redes sociais, ferramentas de pesquisa e a internet, no geral, personalizam o conteúdo distribuído com base nas preferências dos usuários. Isso pode levar à criação de nichos de público que só são expostos a um determinado tipo de assunto, e isso torna cada vez mais difícil o alcance a novos públicos ou exploração de estilos alternativos. No vídeo abaixo, Pariser faz uma breve explicação sobre esse fenômeno:
A economia da atenção
Com milhões de pessoas compartilhando conteúdos online, a competição por atenção é cada vez mais feroz. Os algoritmos tendem a favorecer conteúdos com mais chances de engajamento e o tráfego pago. Crescer de maneira orgânica está cada vez mais difícil.
É aquela velha máxima adaptada: um post é o mais visto porque ele é o mais visto.
Esse contexto é particularmente delicado para artistas. A pressão para ter uma presença marcante nas redes pode impactar negativamente seu processo, seja pela exigência de postar conteúdos novos de maneira constante ou ainda a necessidade de se seguir uma “estética” dentro dos padrões de cada rede, o que pode vir a afetar a sua autenticidade e expressão criativa.
Ainda que a gente não perceba, nossos gostos também são moldados pelas nossas experiências digitais.
A superficialidade da experiência digital
Este é um desdobramento da economia da atenção. A rolagem constante e rápida nas redes sociais pode resultar em uma apreciação superficial dos conteúdos. Vídeos curtos, frases de efeito, caça-clique, memes, músicas de pouco mais de 1 minuto, textão só em caso de utilidade pública mesmo.
As pessoas podem passar apenas alguns segundos olhando para uma postagem antes de seguir para a próxima. Isso cria um desafio para as áreas que desejam/requerem que seus espectadores mergulhem mais profundamente em suas criações. Quem nunca aumentou a velocidade de um vídeo ou áudio que atire a primeira pedra.
Conclusão provisória
O campo das artes enfrenta desafios significativos em uma era moldada por algoritmos que personalizam a experiência digital da sua audiência. A competição por atenção, a superficialidade da apreciação das postagens e a pressão para seguir tendências são apenas alguns dos obstáculos a serem enfrentados.
As redes sociais são movidas por atenção. Quanto mais engajados uma rede conseguir manter seus usuários, tanto maior sua taxa de sucesso perante suas concorrentes.
Mas se a casa sempre vence, o que nos resta a fazer? Precisamos criar outra casa então.
Questionar o estado atual das coisas é um bom começo. Sabemos que esses são alguns dos sintomas de um problema maior, e não podemos deixar de falar sobre o elefante na sala: nosso atual modo de produção. Qualquer solução que possa ser aventada passa por repensar o modo de vida capitalista.
Já temos diversos movimentos que questionam as bases sobre as quais o mundo atual foi construído, inclusive dentro das artes. Precisamos nos unir e fortalecer cada vez mais essas iniciativas.
Assim como Steven Mithen, no livro A pré-história da mente, defende que a explosão cultural – descrita por arqueólogos e que teria ocorrido na passagem do Paleolítico Médio ao Superior –, tenha sido, na verdade, “uma série de faíscas culturais que acontecem em momentos diferentes e partes diferentes do mundo” [1]; acredito que a solução para as questões atuais também virão dessas fagulhas que, ao se multiplicarem, se tornarão um novo big bang e mais um marco para a nossa evolução.

Nota:
[1] MITHEN, Steven. A pré-história da mente: uma busca das origens da arte, da religião e da ciência. São Paulo: Editora Unesp, 2002. Pág. 248.
Comentarios